terça-feira, 8 de janeiro de 2008

O "PRESIDENTE BOSSA-NOVA"


A música de “fossa” estava vivendo seu auge no início dos anos 50. Em 1952, o “rei da voz”, Francisco Alves (Chico Viola), morreria em um acidente de automóvel; em 1954, Getúlio se suicidaria, em 1955 Carmem Miranda faleceria em Los Angeles. O Brasil estava triste. Contribui para essa tristeza a perda da Copa do Mundo de futebol. Depois de uma campanha arrasadora, a seleção brasileira só precisaria empatar na última partida contra o Uruguai, para se sagrar campeã. Depois de estar vencendo por 1 x 0, permitiu que o time da camisa azul-celeste virasse o placar em 2 x 1, na inauguração do Maracanã, no Rio de Janeiro. Foi um dos maiores traumas da história da cultura popular brasileira. A auto-estima estava baixíssima, a ponto de o jornalista, escritor e dramaturgo Nélson Rodrigues ter proposto a teoria segundo a qual éramos, perante o resto do mundo, acometidos de uma síndrome de vira-latas.
A música de “dor-de-cotovelo” era a versão brasileira do blues norte-americano e viria a revelar importantes cantoras, como Sílvia Telles, Maysa e Dolores Duran – as duas últimas também compositoras.
O grande sucesso de 1952 foi Ninguém me ama, de Antônio Maria e Fernando Lobo:
Ninguém me ama
Ninguém me quer
Ninguém me chama
De meu amor
A intérprete era a estreante Nora Ney, egressa do fã-clube de Dick Farney. Os fãs-clubes de Farney e Lúcio Alves eram reduto para jovens que rejeitavam samba, carnaval e queriam consumir música norte-americana, sobretudo o jazz. Em meio à tristeza com o tiro e a carta de Vargas e com as letras desesperadas das músicas de “dor-de-cotovelo”, estava sendo semeado o decreto de chega de baixo-astral!
Nos encontros nos fãs-clubes, além de consumir música, faziam música. Chamavam a atenção as inovações harmônicas de Johnny Alf ao piano e de João Donato ao acordeão, que podem ser entendidas como pré-bossa.
Em novembro de 1954, o governador de Minas Gerais, Juscelino Kubitschek, lançou sua candidatura pelo PSD. Em abril de 55, João Goulart foi lançado como vice, na mesma chapa, pelo PTB. Ambos tinham origem getulista – aliás, foi no enterro de Getúlio que Osvaldo Aranha e Tancredo Neves articularam tal aliança – e isso assustou a UDN, que teve como candidato o general Juarez Távora. Ademar de Barros – que pelo acordo de 1950 seria o candidato de Vargas em 1955 – saiu sozinho, pelo PSP. Os integralistas lançaram Plínio Salgado.
As eleições se realizaram em 3 de outubro de 1955, apesar das tentativas da UDN de desmoralizar a chapa PSD-PTB (o jornal de Carlos Lacerda, por exemplo, publicou a chamada Carta Brandi, que tentava envolver Jango em um contrabando de armas da Argentina). Pelo suposto plano, as armas seriam usada na instalação de uma “República Sindicalista” no Brasil. Depois de uma investigação ficou provada a falsidade da carta – a dobradinha Juscelino e Jango foi a vencedora.
Diante do resultado das urnas, Lacerda passou a, mais uma vez, clamar por um golpe: “Não podem tomar posse, não devem tomar nem tomarão posse”.
O plano de golpe, que pretendia colocar no poder alguém de oposição a Juscelino e Jango, esbarrava em um problema: general Teixeira Lott. Antes de mais nada, era preciso destituí-lo do cargo de Ministro da Guerra.
No dia 5 de novembro de 1955, alegando problemas de saúde, o presidente Café Filho saiu de licença e foi substituído por Carlos Luz, Presidente da Câmara dos Deputados. Isso se deu quatro dias depois de o coronel da ESG, Bizarria Mamede, ter proferido um discurso que feria o Código Militar. Mamede disse que a vitória JK e Jango foi uma “mentira democrática”.
Diante da insubordinação de Mamede, Lott solicitou primeiro ao chefe do Estado-Maior das forças Armadas e depois ao Presidente em exercício que punisse o coronel. Seu pedido foi recusado por duas vezes. Lott pediu demissão.
Porém, no dia 10 de novembro, Lott foi procurado pelos principais comandantes militares do Rio de Janeiro, que lhe mostraram a armadilha em que caíra. Na madrugada do dia 11, o general botou as tropas na rua, ocupou o Rio de Janeiro e destituiu Carlos Luz.
Com o apoio de quase totalidade do exército, o Presidente do Senado, Nereu Ramos, assumiu sob estado de sítio. Em 31 de janeiro de 1956, JK e Jango foram empossados.
A canção abaixo é uma composição do menestrel Juca Chaves. Humorista e crítico político, Juca simpaticamente critica Juscelino, retratando-o como o Presidente Bossa Nova. Apesar de toda a democracia, a canção foi proibida pela censura e só gravada em 1961:
Presidente bossa-nova

Bossa nova mesmo é ser Presidente
Dessa terra descoberta por Cabral
Para tanto basta ser tão simplesmente
Simpático, risonho, original

Depois desfrutar da maravilha
De ser o Presidente do Brasil
Voar da velhacap pra Brasília
Ver Alvorada e voar de volta ao Rio

Voar, voar, voar
Voar, voar pra bem distante
Até Versalles, onde duas mineirinhas
Valsinhas dançam como debutante, interessante
Mandar parente a jato pro dentista
Almoçar com tenista campeã
Também poder ser bom artista, exclusivista
Tomando com Dilermando umas aulinhas de violão

Isso é viver como se aprova
É ser um Presidente bossa-nova.

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